“Algumas pessoas já chegaram para mim e disseram: você me fez ganhar o dia, eu estava muito mal e você me fez ganhar a minha noite”.
Otávia Ohana Meireles Lima, 20 anos, é um daqueles exemplos que inspiram a fé na arte. Mesmo sem possuir o sonho de ser bailarina, a campinense já demonstrava inclinação para dança na infância, talento expresso através das coreografias que ela montava com as colegas da escola. A paixão pela dança acentuou-se quando ela ingressou na carreira artística com seus 7 anos de idade, por meio do curso de ballet oferecido pela Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), tendo como uma das fundadoras a professora Claudia Saboya, que incentivou Otávia a fazer o teste. Desde então, através da sua arte, Otávia realiza e desperta sonhos por onde passa (o que a fez chegar à Suíça!).
Ao longo da carreira, Otávia teve que aprender a conciliar os estudos, trabalho e as aulas de dança, já que para permanecer no ballet da UEPB era preciso estar com as notas boas na escola. A bailarina conta que, além da responsabilidade que lhe foi incumbida precocemente, uma das dificuldades enfrentadas, dizia respeito à cor de sua pele: “Eu sentia que algumas meninas olhavam estranho...”. No entanto, isso não a incomoda mais e ela se sente feliz por ter persistido apesar dos desafios.
Na época, os alunos do ballet estudavam aproximadamente seis anos até comporem o Grupo de Ballet, que é a parte profissional do curso e que representa a UEPB nos festivais de dança. Entretanto, um professor vindo do Ceará percebeu o bom desempenho de Otávia nas aulas e a selecionou para remontar uma coreografia.
A partir daí, ela ingressou no grupo e se sagrou, com apenas 12 anos de idade, a mais nova bailarina do Grupo de Ballet da UEPB. Passados dois anos, a bailarina deixou as aulas (não mais obrigatórias) e passou a compor apenas o grupo, ao qual faz parte até hoje.
VIVER DE ARTE
Apesar de já ter uma boa experiência profissional, Otávia relata que enfrenta dificuldades comuns a quase todos os artistas alternativos. “Viver de arte é muito difícil. Você trabalha por amor, porque eu já dancei por quinze reais”. A sensação inexplicável de estar em um palco, com luzes, plateia, e cortinas se abrindo, é incrível, e a bailarina deixa claro que esta sensação é mais valiosa do que qualquer cachê e se torna uma motivação para continuar acreditando no poder da arte.
Embora sua formação artística seja toda voltada ao ballet clássico, profissionalmente, Otávia atua na dança contemporânea, devido a sua paixão por movimentos mais livres, que lhe proporcionam maior possibilidade de inovar.
MOVIMENTOS E INSPIRAÇÕES
Ela explica que, apesar das várias técnicas existentes neste ramo da dança, bem como no ballet clássico, a oportunidade para diversificar os movimentos é maior, além da dificuldade de seguir o estereótipo imposto às bailarinas clássicas.
“No ballet clássico existe uma estrutura corporal muito predominante. Tem que ser magra, com as linhas estreitas... Você tem que ser alongada, não pode ser muito alta, mas também não pode ser baixa. Existe um padrão muito grande e eu não estou nesse padrão”, avalia .
Para elaborar movimentos, ela se inspira nas características e nos sentimentos das pessoas, e até mesmo em situações cotidianas, como por exemplo, olhando a movimentação nas ruas e no Terminal de Integração de ônibus de Campina Grande: “No contemporâneo tem essa liberdade”, salienta.
Foto: Isabel Costa
INTERCÂMBIO
Em 2015, a arte presenteou Otávia com uma das maiores experiências de sua vida: um intercâmbio na Suíça durante três meses. A seleção para o intercâmbio não era esperada pela bailarina que, acompanhada pelo Grupo, representava a UEPB em um evento de dança em Fortaleza-CE.
Ela foi convidada a participar de uma das oficinas ministradas pelo professor Marcelo Pereira, que reside na Suíça há 8 anos, e, novamente, deixou seu talento transparecer através da dança, chamando a atenção de alguém de renome na área. “Eu fui selecionada, não sabia que era um teste”, disse ela.
A viagem provocou uma mudança em sua vida, profissional e pessoal e, ainda na Suíça, ela machucou o pé, ocasionando a descoberta de uma Tendinite. O incidente e a doença a fizeram se ausentar das aulas durante uma semana, e Otávia se lembra da frustração que o episódio trouxe à sua carreira naquele momento. “Ver a galera lá fazendo aula, montando os trabalhos e eu só olhando, foi muito doloroso.”
EMOÇÃO NA SUÍÇA
Para ela, um dos momentos mais marcantes do intercâmbio, foi quando no fim do espetáculo, uma menina alemã lhe procurou muito emocionada. Mesmo sem entender o idioma da espectadora e estando tomada por emoção, a bailarina pediu ao professor que mediasse o contato, e o mesmo a surpreendeu com a resposta: a menina dizia que iria iniciar sua carreira na dança por ter visto Otávia dançar.
Por estas e outras experiências, a jovem afirma que existe “uma Otávia antes da Suíça e uma depois da Suíça”, porque “enriqueceu, pessoalmente, profissionalmente [...] em tudo!”.
Atualmente, Otávia almeja participar de algumas audições para entrar em uma companhia de dança profissional, como também estudar em um curso técnico de dança para, só assim, poder viver da arte.
Em relação à construção de uma carreira internacional, a bailarina conta que pretende dar início logo após conseguir sua estabilidade financeira no Brasil, pois há questões como o custo de vida e o aprendizado de um novo idioma que ainda necessitam ser aprofundadas.
Para os que estão iniciando ou pretendem ingressar numa carreira artística através da dança, Otávia deixa o seu recado:
“É bem difícil, mas pode ter certeza que é bem gratificante. Se você quiser por hobbie ou por profissão... Você só vai sentir quando estiver em cena. Quando você se arrepiar inteira, quando a terceira campainha tocar para abrir a cortina, aí você vai sentir uma sensação que não dá para explicar”.
A bailarina finaliza com um importante incentivo: “Permaneça! Não desista! Porque por várias vezes eu já pensei em desistir, mas o universo faz com que eu continue e dá tudo certo”.
FICHA TÉCNICA:
Reportagem: Helena Souto e Sara Albuquerque.
Redação final e edição: Bruna Couto.
Monitoria: Dalisson Markel
Supervisão editorial: Rostand Melo
Locação: Teatro Municipal Severino Cabral
Agradecimentos: Erasmo Rafael, Zita Almeida e Beatriz Vieira.